• Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do IBGE, tambĂ©m aponta alta nos gastos com carnes e alimentos preparados;
  • Piora nutricional ameaça economia e preocupa especialistas.

Texto e fotos: Sociedade Vegetariana Brasileira

Os alimentos ‘in natura’ e minimamente processados perderam espaço na mesa do brasileiro, nos Ăºltimos quinze anos. O destaque ficou com os cereais, leguminosas e oleaginosas, que agora ocupam metade do espaço no orçamento domĂ©stico, em comparaĂ§Ă£o ao inĂ­cio dos anos 2000. Os dados da Ăºltima ediĂ§Ă£o da POF, referente a 2017/18, mostram que a populaĂ§Ă£o destinou apenas 5% da despesa mĂ©dia mensal para o grupo deste tipo de alimento. Na ediĂ§Ă£o de 2002/03 da mesma pesquisa, o Ă­ndice era de 10,4%. As regiões Nordeste (6,7%) e Norte (5,7%) marcaram os melhores resultados no levantamento de 2017/18, enquanto o Centro-Oeste (5,1%), o Sudeste (4,5%) e o Sul (3,7%) ocuparam as Ăºltimas posições.


Por outro lado, os recursos destinados ao consumo de carnes, vĂ­sceras e pescados, registraram crescimento, saltando de 18,3% em 2002/03 para 20,2% em 2017/18. Os Alimentos Preparados, por sua vez, tambĂ©m acompanharam o movimento das carnes e passaram de 2,3% para 3,4% do orçamento domĂ©stico, no mesmo perĂ­odo. A mudança na base nutricional do brasileiro nĂ£o ameaça apenas o meio ambiente, mas principalmente a sua saĂºde, diz a AssociaĂ§Ă£o DietĂ©tica Americana. AlĂ©m de consumir menos recursos como Ă¡gua e solo, uma dieta a base de vegetais previne vĂ¡rias doenças. Veganos e vegetarianos tĂªm menos risco de desenvolver problemas cardĂ­acos, diabetes do tipo 2, hipertensĂ£o, certos tipos de cĂ¢ncer e obesidade. O baixo consumo de gorduras saturadas associado Ă  maior ingestĂ£o de vegetais, frutas, grĂ£os integrais, legumes, derivados de soja, castanhas e sementes (todas ricas em fibras e fitoquĂ­micos) sĂ£o caracterĂ­sticas de dietas veganas e vegetarianas, resultando em baixo nĂ­vel de colesterol e melhor controle da glicose (aĂ§Ăºcar).

ODS-ONU

Para especialistas, o desequilĂ­brio nutricional tambĂ©m pode afetar o desenvolvimento econĂ´mico e social do Brasil. O cenĂ¡rio contraria, inclusive, boa parte dos 17 Objetivos do Desenvolvimento SustentĂ¡vel, elaborado pela OrganizaĂ§Ă£o das Nações Unidas (ODS-ONU) em 2015 e com metas estabelecidas atĂ© 2030.

“A manutenĂ§Ă£o de animais como estoques de alimento exerce uma pressĂ£o sem precedentes sobre todos os ecossistemas. AlĂ©m de produzir resĂ­duos sĂ³lidos, lĂ­quidos e gasosos em grande quantidade, dietas com alta proporĂ§Ă£o de alimentos de origem animal estĂ£o associadas a prevalĂªncias mais altas de doenças cardiovasculares, diabetes e vĂ¡rios tipos de cĂ¢ncer”, avalia Renata Victoratti, Nutricionista e Assistente de Campanhas da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB). Uma pesquisa recente da Universidade de Oxford mostra que a reduĂ§Ă£o no consumo de carnes poderia economizar mais de R$ 100 bilhões em gastos com saĂºde e perda de produtividade no trabalho no Brasil, atĂ© 2050. O montante representa quase a metade do investimento necessĂ¡rio para expandir os serviços de saneamento e tratamento de Ă¡gua para os 100 milhões de brasileiros que ainda nĂ£o o possuem.

De acordo com um relatĂ³rio do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento SustentĂ¡vel (CEBDS) e AgĂªncia AlemĂ£ para a CooperaĂ§Ă£o Internacional, a pecuĂ¡ria Ă© o setor da economia com os maiores custos em perda de capital natural: para cada R$ 1 milhĂ£o de receitas do setor, R$ 22 milhões sĂ£o perdidos em capital natural e outros danos ambientais. De forma semelhante, as operações de abate e processamento de animais custam ao paĂ­s, em danos ambientais, 371% a mais do que a receita que geram.

Obesidade

A falta de uma alimentaĂ§Ă£o equilibrada fez o nĂºmero de pessoas obesas disparar mais de 70% entre 2006 e 2019, no Brasil. O Vigitel, que pertence ao sistema de VigilĂ¢ncia de Fatores de Risco para doenças crĂ´nicas nĂ£o transmissĂ­veis do MinistĂ©rio da SaĂºde, aponta que a porcentagem de brasileiros obesos passou de 11,8%, no inĂ­cio do perĂ­odo, para 20,9% no ano passado. Em outras palavras, dois em cada dez brasileiros sofrem com esse problema atualmente. De acordo com o Jornal da USP , alĂ©m de aumentar o risco de cĂ¢ncer, a obesidade Ă© um dos fatores de risco da covid-19 . Fatores como o aumento do sedentarismo, reduĂ§Ă£o da atividade fĂ­sica, sobretudo para o lazer, e a piora na alimentaĂ§Ă£o tendem a agravar o problema.

Segunda sem carne

A Campanha Segunda Sem Carne (SSC) Ă© um convite a substituir, pelo menos uma vez por semana, a proteĂ­na animal pela proteĂ­na vegetal. Coordenado pela SVB, a SSC brasileira Ă© atualmente a maior do mundo na promoĂ§Ă£o do veganismo, distribuindo mais de 80 milhões de refeições Ă  base de vegetais em 2019, crescimento de 20% em relaĂ§Ă£o ao ano anterior. O objetivo do trabalho Ă© promover um primeiro passo para a descoberta de novos sabores, promovendo uma alimentaĂ§Ă£o balanceada e contribuindo tambĂ©m para a prevenĂ§Ă£o de doenças provocadas pelo consumo em excesso de produtos de origem animal. Atualmente, mais de trĂªs milhões de pessoas sĂ£o beneficiadas pelo programa, considerado o maior do mundo atualmente. A SSC estĂ¡ presente em mais 100 municĂ­pios e economiza mais de duas mil toneladas de carne bovina anualmente. “É importante lembrar ainda sobre o lançamento do novo Programa ‘PROVE’, que estĂ¡ sendo elaborada com a proposta de incentivo Ă s proteĂ­nas vegetais por meio de propostas de educaĂ§Ă£o alimentar e nutricional. Nosso objetivo Ă© ajudar na retomada das leguminosas como protagonistas do prato e valorizar os aspectos econĂ´micos, sociais e culturais desses alimentos”, observa Renata.