A produção de origem chinesa é uma ótima surpresa, tanto na técnica de realização como nas atuações
Texto: Eduardo
Abbas
Fotos: PlayArte Pictures
Sombra, esse substantivo tem por definição ser um espaço menos iluminado, sobre o qual não incide luz direta, mas também foi uma das grandes sacadas do desenhista espanhol Sergio Aragonés na deliciosa revista MAD. Ele é o criador de uma coluna que tinha a chamada: “Quem sabe o mal que se esconde por trás dos corações humanos? A Sombra Sabe!” e esse é um ótimo ponto de partida para se entender essa ótima produção Made In China.
O roteiro é baseado em uma prática muito comum no passado das províncias chinesas, existiam os dublês de corpo, conhecidos como “sombras”, que substituíam seus mestres durante um determinado momento das suas vidas ou para sempre, criando uma forma de perpetuar a imagem do tutor, mas nem tudo eram flores e nem sempre se aceitava o destino passivamente, daí a coisa de ser mau em algum momento da vida do outro. Como essa cultura oriental é pouco ou quase nada conhecida no ocidente, muitas vezes romantizar ou tentar “ocidentalizar” algumas práticas pode ser um desastre, mas ouvir de quem conhece e vivencia a história, ela ganha outro peso e significado.
Estreia hoje no Brasil Shadow (Perfect Village Entertainment, LeVision Pictures, Tencent Pictures, PlayArte Pictures), um filme que levou quase 4 anos depois da sua primeira exibição no festival de Veneza para chegar aos nossos cinemas, ainda bem que chegou, assim podemos apreciar a visão mais elaborada da sétima arte pelos olhos chineses.
Escrito e dirigido por Zhang Yimou (A Grande Muralha) o filme é ambientado durante a era dos Três Reinos da China (220-280 DC), conta a história um rei e seu povo que foram expulsos de sua terra natal e vão tentar recuperá-la. Violento e ambicioso, o monarca tem métodos e motivos misteriosos, seu general é um visionário que anseia vencer a batalha final e prepara planos em segredo, as mulheres do palácio lutam para encontrar a redenção em um mundo onde não têm lugar e um plebeu chamado “Senhor de todo o mundo”, esses são personagens cujas forças inexoráveis desta história fazem todo sentido.
Você não precisa ser um profundo conhecedor da língua Mandarim (que é falada no filme) para entender que os atores que dão vida aos personagens são muito bem dirigidos por Yimou e não abusam de gritos desnecessários ou atitudes violentas ao extremo, romantizam com equilíbrio um enredo muito bem construído. A narrativa é lenta por conta da técnica utilizada na filmagem, ela é exuberante e transforma cada tomada em uma tela.
O espetacular trabalho do diretor de fotografia Zhao Xiaoding, parceiro de longa data do diretor, é inspirado na técnica chinesa de pintura a pincel, os cenários e roupas em branco e preto deixam a cor para os rostos e corpos dos atores em tomadas internas, já as externas, abusam do contraste provocado pela chuva, criando um ambiente único. A montagem pode dar impressão de que o longa tem mais de 116 minutos de exibição em alguns casos, quando se trata das cenas de luta ou treinamento, a rotação é dinâmica, cheia de detalhes e profundamente explorada.
Shadow é uma dessas jóias que, vez ou outra, encontramos escondidas dentro de gavetas embrulhadas em papel de presente, são filmes que merecem mais atenção do ocidente, são momentos da história da humanidade que aconteceu no misterioso oriente e que nós, ocidentais de baixo interesse, deixamos passar quase sempre. É preciso conferir, vale a pena e o ingresso, nas salas seguem todos os processos de segurança e prevenção da Covid-19 e que seja bem-vinda a cultura milenar da Ásia Oriental, 非常感谢你 (Fēicháng gǎnxiè nǐ).
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